São Miguel dos Milagres. Fiquei surpreso com o tamanho do recuo que
o mar fazia com a maré baixa, durante a caminhada até a praia do Toque. Até me
animei em andar um pouco para ver o mar lá adiante, mas a preguiça bateu e
decidi seguir meu rumo. Corpo protegido
pelo protetor solar nosso de cada dia e ansioso para chegar a meu destino final.
Assim que pisei na praia, aquela
decepção de ver o recuo do mar também por lá. Caminhei mais um tanto, atravessando um pouco mais da metade do Toque. Decidi levantar acampamento,
deixar minhas coisas na canga e adentrar mar adentro para um “meio” mergulho.
Quando voltei para pegar um
bronze e retocar a maquiagem com o protetor, surge a primeira boa surpresa do
dia: percebi que vinha caminhando um menino uniformizado, acenando em minha
direção. Fiz a linha Kátia –“ não tô vendo nada”, aproveitando o escudo do meu
óculos de sol a la Bono Vox, vermelho. Beeeeem discreto (risos). Quando ele
chegou perto gritou: “’seu’ Lira, tudo bem?” Era Brenno, um garoto que tinha
conhecido no dia anterior. Era amigo de Elvis, o gerente da pousada do Sonho,
onde estava hospedado. Disse que já tinha me avistado e acenou para que eu o
visse, mas sinceridade, não prestei atenção. Ele trabalha em uma das pousadas,
que ficam em frente à praia do Toque. Foi gentil e me ofereceu uma cadeira da
pousada para poder me refestelar como um calango no sol. Fiquei com receio e
perguntei se não iria trazer problemas a ele, mas Brenno insistiu para que eu
aceitasse o convite. E nessas horas, o importante é não se fazer de rogado.
Aceitei e fui caminhando até a cadeira e o guarda sol. E Brenno estava uma
graça com seu uniforme. Estava parecendo o guarda florestal do desenho do Ze
Colmeia misturado com Tatoo, da Ilha da Fantasia. (risos)
Quando começo a entrar em estado
alfa para pegar o bronze, a primeira
provação-para-me-tornar-um-ser-melhor-e-garantir-meu-latifúndio-no-céu: um
jovem senhor de idade estava com um grupo de crianças na água. Ficava
repreendendo os meninos com qualquer coisa que faziam no mar. Aos berros. Era a família dó-ré-mi-fá-sol-lá...stimavel. Quer dizer, não
havia necessidade de ficar gritando feito uma lavadeira de rio, como ele estava
fazendo. Devia dar exemplo, concordam? O mais gozado era ele chamando os meninos
com aqueles típicos nomes que só tem no nordeste: “Para de ficar jogando água
no Joeldson, Adejanílson!” (risos); “Olha aqui, Claíslon, se continuar com essa
palhaçada, te afundo os ‘zolhos’”. Um chilique desnecessário. Já estava até visualizando o destino dessas crianças, como (risos) bombas humanas do Estado Islâmico. Com essa cena de
barraco de favela, só me restou adentrar ao “Mundo Encantado de Alice”.
E a partir daí, a brisa começou a ficar realmente boa.
Chamei Brenno para perguntar por
que o hóspede estava tão agitado e ele respondeu que o senhor estava bêbado.
Também me corrigiu, informando que o jovem senhor era morador de São Miguel dos Milagres. Enquanto
Brenno me explicava, comecei a ter um acesso mental de riso, me lembrando de
todos os nomes que tinha escutado, mas desconfio que Brenno sacou algo. Quando
dei por mim, estava de verdade sorrindo com aquele sarcasmo peculiar. Comecei a
ficar mega-pra-lá do Mundo de Alice, pedi licença a Brenno e me levantei para
mergulhar. A maré já estava alta e o mar estava cheio. E eu comecei a ter uma vontade absurdamente
louca de entrar naquela água, como se estivesse naqueles clipes “Garota do
Fantástico”. O mar realmente não estava só pra peixe. Mas a praia ainda iria me
reservar bons momentos, com mais histórias e personagens pra lá de
interessantes.