Enquanto lia alguns sites de notícias para me atualizar
do esgoto de nossa política, meu ouvido de tuberculoso estava atento a uma
conversa de Sílvia e Carlito sobre música, com recorte na MPB. Silvia dizia que a música atual é tudo muito
igual, que nada de novo a representava. E fazia comparações com músicos, poetas
e letristas do calibre de Nelson Cavaquinho, que estava em audição durante o
papo. Aí eu entrei na conversa e falei que ela estava sendo muito radical com a
comparação, até mesmo porque é uma covardia comparar a música “rala” de hoje com os grandes clássicos de
antigamente. Sílvia argumentou que existem muitos artistas “Marcelo Jeneci de
ser”. Tudo muito igual. Também concordo. Utilizam a mesma técnica vocal de
garoto melancólico, voz anasalada e linear, achando que esse tipo de
interpretação é a nova forma “cult” de ser. Pra mim, é de uma preguiça sem
tamanhos. Fora que os artistas de hoje não sabem diluir seu talento em seus
trabalhos.
E a começa ficou animada. Argumentei dizendo que tinha poucos artistas da safra atual interessantes, mas que seria uma covardia tamanha compararmos os artistas de
hoje com os de ontem. Até porque a cultura mudou e como um camaleão se adaptou,
por exemplo, às grandes mudanças tecnológicas.
A internet, com sua cultura de rede de regurgitar algo rápido e de fácil
digestão para as pessoas hoje em dia, tirou todo o interesse delas de escutarem com mais atenção a profundidade das canções,
seja em suas letras contundentes e em seus arranjos bem trabalhados,
sofisticados, arrojados. Sei que não dá
para viver de nostalgia, é verdade. Sou da época pré internet. Para eu saber
sobre algo bacana no cenário musical, eu tinha que comprar pilhas de revistas.
Mas voltemos à questão da qualidade musical de hoje em dia e de outrora. Os
artistas de hoje de uma certa forma, se contaminaram com essa cultura de fácil acesso.
Fora a técnica de processo contínuo que todos
se utilizam, inspirados em algum
Jeca Tatu pós-modern. Os genéricos
dos genéricos dos genéricos.
Pegue por exemplo,
O quereres, do Caetano. Quando a escutei pela primeira vez, fiquei em,
brasas, não só pelo fato de ser mais uma grande música dele, mas principalmente
pela complexidade dela. É bom lembrar mais uma vez que não existia internet, logo, eu não
tinha como pegar a letra de O quereres
tão fácil. Tinha que aguardar uma edição de alguma revista musical, que sempre
colocava letras de canções que estavam despontando no cenário longínquo dos
anos 80. Para minha sorte, O quereres
saiu na finada revista Bizz. E o que era mais agradável: os professores (pelo menos os
que me ensinaram) adoravam conversar, comentar e discutir sobre as metáforas
embutidas nas canções que sempre tinha curiosidade de entender.
E a pergunta de hoje é: temos um O quereres nos dias de hoje? Temos alguma letra com a proeza
poética de ícones como Vinícius, Cartola, Nelson Cavaquinho, Caetano, Chico, feita pelos Silvas, Jenecis, Camelos de hoje? Coloco no plural porque deles surgiram tantos
outros idênticos como eles. O genérico dos genéricos dos genéricos. As letras de ontem
me inquietavam e me faziam questionar. As de hoje tem frontal demais
(risos). E pelo que vejo nos jovens hoje em dia, que absorvem uma cultura tão
nula, inquietação é algo que infelizmente falta para a evolução na vida
moderna. Se eu quero me interessar pelos artistas de hoje? Parafraseando Filipe
Catto, “eu adoraria”. Mas eu fico aguardando, em posição de yoga, algo
instigante para minha audição.