Fui acompanhar a gravação de um concerto no Sesc Bom
Retiro, na última sexta-feira. Mesmo cansado, arranjei um resto de energia para
trabalhar no fim de noite. Val estava acompanhando a gravação, junto com a
DNArte, produtora que contratamos para produzir o programa. Cheguei no momento
que Flavio, diretor do programa, terminava de gravar o depoimento da curadora
do Festival de Música de Câmara, Claudia Toni. Esse festival, que se encerrou
ontem, percorreu várias unidades do Sesc - capital, litoral e interior. Já
estava mais do que na hora de se ter um evento para formação de público de
música erudita. Formar e ampliar esse
público. E eu sei o quanto é difícil formar esse público, já que a música
clássica necessita de uma concentração maior na audição para você saborear. Escutar
música erudita, para mim, é ficar em estado de graça.
Flavio me levou para conhecer o pianista que íamos
gravar. Se chama Cristian Budu. Brasileiro, de origem romena. Uma graça de
pessoa. Mora há 4 anos em Boston, nos Estados Unidos. Está terminando um
mestrado na terra do tio Sam. Ele me contou que quer fazer aqui no Brasil uma
série de recitais, mas com um diferencial: são concertos feitos em domicílio.
Ideia bem bacana que faz sucesso nos EUA. Imagine escutar uma obra de Haydn ao
pé do ouvido, de forma mais íntima. Ah, e eu não poderia esquecer meu leque
para a audição.
E o que dizer de Cristian e sua performance, que me
deixou nocauteado na plateia do teatro do Sesc Bom Retiro. Para abrir as mesas de trabalho, ele pediu a
bênção de Beethoven, tocando as 3 bagatelas do gênio. Na sequencia, interpretou
3 estudos de Alexander Scriabin. Durou meia hora. Ele me deixou tenso. E
intenso. Prestei bastante atenção no seu olhar, no seu manusear. Ele parecia
estar incorporado, tamanho a sua concentração. Intervalo de vinte minutos para
respirar um pouco. Na segunda parte do programa, ele tocou Schuman, Villa Lobos
e fechou com chave de ouro, ao apresentar sua interpretação ao insofismável
tormento Mephisto, de Liszt (permita-se escutar, no vídeo abaixo) . Eu realmente senti muito sangue sendo jorrado das
teclas do piano. Ele lavou a minha alma. É lógico que teve o bis. Ele mesmo brincou
que depois de tanto sangue, iria tocar algo mais leve. Foi de Chopin. Saí
passado a ferro de quina.