Depois de um breve período de hibernação, retorno ao meu
convívio com meu diário virtual. Juntou-se a correria do trabalho, a vida
política desse país que reforça meu estado de desânimo e descontentamento e situações
que me fizeram ter um tremendo bode para escrever. Minha prioridade aqui é relatar
o dia-a-dia de meu cotidiano. Tenho o cuidado de não transformar meus incômodos
numa relação de terapia com o blog e com quem lê. Por mais irritado que eu
ficara desde a semana passada, não me senti a vontade de vomitar minhas
sensações. Nessas horas, preferi acautelar-me e esperar a raiva passar para
poder até dividir as inquietações com quem lê esse pequeno espaço dedicado às
peripécias da vida moderna.
A melhor maneira de aquietar a alma mediante ao stress
com colegas e amigos é me jogar num bom roteiro cultural. Quis me priorizar. Vi
peças, filmes, exposições apenas com a minha companhia. Foi uma boa forma de
apaziguar a ira. A solitude foi mais que necessária para me fazer ficar de pé diante
das adversidades. Ela me mostrou que a vida segue pra frente e que os conflitos
são necessários para meu amadurecimento. E vamos pra next!
Para quem não teve a chance, valeu a pena ter
acompanhado o MIT – Mostra Internacional de Teatro, em Sampa. Ótima curadoria
feita no mapeamento das companhias teatrais em sua segunda edição de evento. Vi
peças medianas e espetáculos que ofereceram para mim momentos de boas
reflexões. Estava sentindo falta de assistir obras que me dessem um belo
chacoalho para fazer uma justaposição com fatos ocorridos em minha vida pessoal no decorrer desses últimos
dias. Para abrir as mesas de trabalho, fui ver A Gaivota, texto de Yuri Butusov, encenado pela companhia de teatro
Satyricon, da Rússia. O espetáculo coloca em questão o desencorajamento do ator
e sua autoflagelação em se torturar na concepção de seu trabalho artístico. Em
resumo colocou-se em pauta se vale a pena desenvolver um trabalho cênico para
instigar uma reflexão ao público que assiste. Um assunto que me interessou a princípio,
mas a montagem em si não se tornou tão atrativa. Apesar da bela produção, o
trabalho de ator da companhia não me convenceu na forma de se passar a mensagem
proposta no texto de Tchekhov. E para me ajudar, acabei comprando ingresso
para ver outra peça no mesmo dia, sem me dar conta que A Gaivota teria 4h45 de
espetáculo e que eu não teria tempo hábil para assistir outra peça. Como A
Gaivota não me comoveu e não me fez nenhum tipo de provocação saí do Auditório
Ibirapuera depois do 3º ato (o espetáculo teve 4 atos), peguei o ônibus em frente ao parque para ir em direção ao Teatro
João Caetano ver As irmãs Macaluso. As
irmãs... fizeram comigo em apenas 1 hora de espetáculo o que A Gaivota não
conseguiu fazer: me tombar. O curioso é que a montagem feita pela Compagnia Sud Costa
Occidentale, da Itália mostrou que com o nada se faz tudo: uma história marcada
pela simplicidade – a relação de um pai com suas sete filhas, com uma luz
básica, apenas uma cruz como elemento cênico e um trabalho primoroso da direção
em tirar das atrizes o sangue necessário para deixar a plateia toda atônita,
graças ao trabalho de ator. Se Antunes Filho assistisse, acho que ele teria
gostado.
Também
vi Canção de muito longe, um monólogo sobre perdas e decepções. Fui com Jorge
ver essa tão bem falada peça teatral. Mas assim que terminou, tive a sensação
de ter visto um trabalho de conclusão de curso. Um monólogo cansativo, sem dar muita
atenção à criatividade necessária na construção de um personagem tão
interessante para se desvendar. Não saí nem um pouco mexido e isso me incomodou
bastante. Mas acho que fechei meu ciclo de peças no MIT vendo uma bela obra-prima
cênica que utilizou-se de efeitos visuais para contracenar com os atores
presentes na montagem. Opus N.7, montagem do Laboratório Dmitry Krymov do Teatro da Escola de
Arte Dramática de Moscou me deixou impressionado e mostrou que interpretação e
efeitos visuais fazem uma bela química. Com dois atos, Opus N.7 mostrou o
preconceito retratado na perseguição aos judeus soviéticos durante o regime de
Stálin; e a censura sofrida pelo compositor russo Dmitri Shostakovich. E o que mais surpreendeu
foi a forma tão poética em retratar a repressão. Apesar do intervalo longo – de
30 minutos, valeu cada segundo ter assistido uma peça para me fazer sair mexido. Foi
inevitável pensar na atual massa reacionária brasileira durante a montagem. Espero
que a mensagem passada pela companhia reverbere em cada pessoa que foi prestigiar
o espetáculo. Estamos precisando urgentemente de lucidez. Resta saber se o
efeito vai bater na consciência do espectador. Aguardando ansiosamente em posição de yoga.